quinta-feira, 9 de julho de 2020

FICHAMENTO DE “TEXTOS, IMPRESSÃO, LEITURAS”, DE ROGER CHARTIER

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS






FICHAMENTO DE “TEXTOS, IMPRESSÃO, LEITURAS”, DE ROGER CHARTIER






Aluno: Marco Magli (RA00180650)
E
Cláudio Nascimento (RA00188059)
 Profa. Dra. Carla Longhi Reis

CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA
DISCIPLINA DE TENDÊNCIAS DA HISTORIOGRAFIA CONTEMPORÂNEA 
SÃO PAULO – SP
2017

Para Roger Chartier, as edições populares, como as edições da Bibliothèque Bleue, eram repletas de recursos visuais entrepostos no texto que induziram uma leitura fragmentada ao público. Esses leitores “liam de um jeito descontínuo e fragmentário que se acomodava às lacunas e incoerências.” (CHARTIER, 2006, p. 224) Recursos visuais esses que poderiam ser xilogravuras, sinopses de capítulos e títulos preliminares.
Também observa-se uma certa intertextualidade, na qual o público, de certa forma, conhecia o formato e o estilo de escrita dos textos por conta de uma memorização de textos passados. Para o autor: “ [...] os livros populares podiam ser memorizados pelos ouvintes [...] a maioria das pessoas, mesmo quando não ouvia diretamente a leitura, lia os livros com um entendimento previamente adquirido [graças] [...] a repetição dos temas e imagens dos livros.” (CHARTIER, 2006, p. 225)
O estilo das camadas populares lerem em muito se diferem da maneira das elites realizarem suas leituras. Nesse momento é introduzido um conceito importante que é o do “modo de ler”, como essa relação leitor/texto. “Nesse contexto, portanto, a leitura popular é entendida como uma relação com o texto que nada têm em comum com a das elites culturais [...] Cada um desses ‘modos de ler’1 tem seus gestos particulares, seus usos próprios do livro [...] oferece o arquétipo de todas as formas de leitura, não importam quais sejam.” (CHARTIER, 2006, p. 226-227).
Portanto, o objetivo da obra de Chartier é propor uma forma nova de se observar e interpretar as leituras, de todas suas possibilidades e ângulos. Assim nesse texto ele apresenta sua preocupação quanto às formas na qual a análise da leitura é feita: “Precisamos desenvolver indicadores das principais divisões capazes de organizar uma história das práticas de leitura [...] por exemplo, entre ler em voz alta, para si próprio ou para os outros, e ler em silêncio; entre ler introspectivamente e em particular e ler em público; entre leitura religiosa e leitura laica;” (CHARTIER, 2006, p.226)
Além de se focar no conteúdo em si dos textos, o autor também coloca uma relevância em sua análise na questão da própria forma física do livro. Na Europa do início das impressões a própria forma na qual o livro era impresso causava uma certa hierarquização entre as obras, “Essa hierarquia, além do mais, é herdada dos tempos em que os livros eram copiados à mão.”. (CHARTIER, 2006, p. 228) Outros aspectos físicos da impressão podem carregar uma carga semântica própria, como as edições de bolso, que têm que ser as mais concisas possíveis para se ajustar a suas propostas. Assim, é visto como a história dos gêneros não só textuais, mas tipográficos são de importância indiscutível para o historiador.
Uma crítica tecida por Chartier é quanto a concepção de cultura popular traçado pela chamada “história cultural francesa”. Para o autor a visão cunhada por esta escola francesa é dicotômica e simplista, tentando colocar em lugares opostos a cultura “popular” e “elitista”, e além do mais “é preciso reconhecer a circulação fluida e as práticas em comum que extrapolam as fronteiras sociais [...] a ordenação dessas divisões observa vários princípios que tornaram evidentes as divergências ou oposições entre homens e mulheres, população urbana e camponeses, católicos e protestantes, mas também entre gerações, profissões e populações vizinhas.” (CHARTIER, 2006, p.230-231)
Igualmente Chartier questiona o contraste entre oral e escrito, defendendo que essa é outra divisão que não pode sempre ser feita de maneira tão clara. Para ele “encontram-se compêndios sobre preparar para a morte, livros de exercício religioso, os guias de boas maneiras e os manuais[...]” São alguns exemplos de textos em que a linguagem escrita não deve ser separada da linguagem oral, pois são recursos complementares.
Outro conceito que é chave para a compreensão das idéias de Chartier é sua proposta da noção de apropriação. Este conceito retoma sua problemática inicial: como pode o mesmo texto causar impressões distintas? Essa noção de apropriação “[...] torna possível avaliar as diferenças na partilha cultural, na invenção criativa que se encontra no âmago do processo de recepção.” (CHARTIER, 2006, p.233) Contudo essa noção de apropriação não é a mesma de Foucault, pois não se volta às “[...] exclusões por confisco, mas as diferenças no âmbito do uso comum [...] Isso equivale dizer que as práticas contrastantes devem ser entendidas como competições, que suas diferenças organizam-se por estratégias de diferenciação ou imitação, e que os diferentes usos dos mesmos bens culturais estão enraizados nas predisposições estáveis próprias de cada grupo.” (CHARTIER, 2006, p. 235-236)
Por fim, Chartier estabelece uma diferenciação entre os usos da impressão no Ocidente, e como este recurso é um divisor de águas para esta parte do globo, e no Oriente. Para ele “Depois de Gutenberg, toda cultura ocidental pôde ser vista como uma cultura da impressão, pois, em vez de ficarem restritos ao uso administrativo e eclesiástico (como na China ou na Coréia), os produtos das impressoras e da composição tipográfica influenciaram a totalidade das práticas e relações.” (CHARTIER, 2006, p.239). Desse modo o autor atenta-se para as complexidades no estudo da leitura e , com visão interdisciplinar típica dos Annales, propõe uma “[...] nova posição no ponto em que se cruzam a crítica textual, a história do livro e a sociologia cultural.” (CHARTIER, 2006, p. 239)

Bibliografia:
CHARTIER, Roger. Textos, impressões, leituras In: HUNT, Lynn. A nova história cultural, Rio de Janeiro, Martins Fontes, 2006.

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